Entrevista que me
foi efetuada por CARLOS ALMEIDA
da revista
ANIM’ARTE, número 111, 2019.
1.
Poesia
Versus prosa:
A poesia e a
prosa são distintas apenas enquanto géneros literários, que expressam dimensões
diferenciadas do ser. No entanto, que seria da prosa sem a criatividade poética
que também a deve estruturar e enervar. Prosa não é sinonimo de prosaico. Mas,
enquanto a minha prosa se submete mais à narrativa, já a poesia reinventa o uso
da linguagem. Prosa e poesia são, em rigor, duas vias literárias que servem os
meus diferentes propósitos de expressão.
2.
Mangualde
Versus Almada:
Mangualde e
Almada são um binómio que pautam a minha identidade a partir da viagem na geográfica sentimental (parabéns,
Aquilino). Em períodos decisivos da evolução pessoal fui alternando entre o
campo e a cidade. Nos contrários encontrei os complementos paradoxais para a
constituição da personalidade que sou. Na verdade, os elementos naturais da
poética colhi-os nas vivências campestres na Beira Alta. E os aspetos
ideológicos e filosóficos derivam mais do ambiente intelectual e irreverente da
Margem Sul e da Capital. A esse arco fui buscar parte dos nutrientes para a
constituição do meu ser inquieto.
3.
Onde
começam e acabam os versos?
Versos ou versus? As oposições surgem para
percorrerem e explorarem os âmbitos do interior. O verso necessita desse
confronto vital que encontra o reflexo no jogo dos contrários (versus), dando assim conta da
ambiguidade metafórica, que preenche a fissura das ressonâncias íntimas e ontológicas.
Se a minha poesia está condimentada pela filosofia analógica (desde a Sombra dos Momentos Felizes até ao Alpinista Descendente), já a minha prosa
está repleta de alusões poéticas. No entanto, são dois convites diferentes: na
poesia alicio ao gozo do delírio da palavra emocionada (Cf. Sereno Fluir das Horas e Desflorar da Flor de Sal); enquanto na
prosa conto estórias acerca de personagens bizarras, por exemplo, em Lugar d’Avós procuro dar satisfação ao
leitor através de uma viagem narrativa pelos recantos da memória.
4.
Que
poeta(s) portugueses e porquê?
Dos poetas
portugueses que me deslumbram, destaco: o apelo à metamorfose das palavras e
das coisas em Herberto Hélder; o erotismo metafórico em Eugénio de Andrade; os
transcursos nos significados linguístico em António Ramos Rosa; a especiaria da
provocação em Alberto Pimenta; o requinte da poesia branca em Ana Hartherly; os
meandros contrastantes dos problemas atuais em Joaquim Pessoa; quanto ao outro
Pessoa, o Fernado, admiro o seu caleidoscópio, perdão, o seu planetário filosófico.
5.
Que
livro em geral escolhe e porquê?
Difícil escolha.
Face à dificuldade, opto por aquele livro que condensa bastantes das minhas
preocupações: Assim Falava Zaratustra
de Nietzsche, uma obra de desafio e incentivo à superação, onde em fascinante harmonia
se conjugam a poesia, a prosa e a filosofia. Ou seja, é uma narrativa alegórica
sobre as alturas – estamos perante o alpinismo ético, que estimula a criação humana,
e também aos conceitos sedutores do sobre-humano, do eterno retorno e da
vontade de poder.
6.
Poesia
na escola? Sim ou não? Porquê?
É imprescindível
levar a poesia à escola! A poesia deve ir à escola das sensações e da
inteligência emocional. O mesmo é dizer, ser um dever educar pela sensibilidade.
Numa época em que o livro é subalternizado, convém colocá-lo sob o olhar dos
jovens em formação. Daí a nossa responsabilidade sobre o futuro da poesia fazer-se
nos compromissos com as novas gerações.
7.
Como
define a sua escrita poética?
Definir é circunscrever
e limitar! Embora a minha poesia busque um modo de pensar e de sentir, que pretende
comunicar acerca do incomunicável - que me desculpe o filósofo Wittgenstein,
que neste caso aconselhava a calar-me. Ao invés, para mim, o poeta não deve ter
receio do risco. Portanto, busco exprimir as imagens invisíveis que tatuam a pele
sensível da alma. Mas haverá ainda quem pretenda partilhar este jogo e prazer
estético, lendo-me? Ou estarei face a um irrevogável ato solitário?
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