quinta-feira, 28 de abril de 2016

Entrevista na CriaPromove

CriaPromove
**De Portugal para o mundo!


Entrevista
ao poeta, escritor,
dramaturgo e encenador


«(…) destaco
Alpinista Descendente enquanto metáfora da vida. Ascendemos com o ideal aceso no coração. O hábito valoriza o esforço da ascensão, embora quaisquer momentos tragam sentido à existência. (…)»
Carlos Alfredo Couto Amaral nasceu em Mangualde em 1960. Licenciado em Filosofia. Professor na Escola Daniel Sampaio (Sobreda de Caparica). Mestre na Simbologia e Estética de Nietzsche. Encenador e dramaturgo, escreveu (G)Estação dos Afetos; Meu Fado muito mais do que uma pirosa estória de amor, 2013 (Edição em parceria com José Teixeira e Xico Braga), levadas à cena pelo GITT. Publicou poesia: A Sombra dos Momentos Felizes (Edições Colibri, 2000); Sereno Fluir das Horas (Edições Colibri, 2004); Desflorar da Flor de Sal (Ed. Minerva, 2010); Alpinista Descendente (Edições Colibri, 2016). Nos encontros de professores galegos e portugueses para a paz orientou oficina de escrita criativa (2013 a 2015).



1.    CriaPromove: Caro poeta, escritor e dramaturgo Carlos Couto Amaral, a sua participação no nosso projeto de promoção/divulgação é para nós um enorme prazer. Queira fazer o favor de partilhar connosco (e com o público leitor) as motivações que o levaram a enveredar pelo fascinante mundo da escrita (poesia, ensaio, teatro, romance) e do teatro/dramaturgia/encenação.

Carlos Couto Amaral: Encetei o percurso literário, há mais de quinze anos, devido ao gosto de partilhar as obras que ia escrevendo, a par de uma alergia à ideia de encerrar os “escritos na gaveta”. Passei a colaborar em revistas literárias; lancei-me nas edições de cinco livros; aventurei-me nas performances e representações teatrais. Movido pela autodescoberta e encontro com o outro. Deste modo, senti que me realizava intensamente numa transcendência estética.

         

2.    CriaPromove: Fale-nos do processo de construção das suas obras literárias e das suas peças de teatro bem como das dificuldades que sente (ou não) na sua elaboração e na afirmação das mesmas junto dos leitores e dos espetadores.

Carlos Couto Amaral: Cultivo a escrita diariamente, primeiramente de rompante, depois é um processo lento de purificação interminável, movido pelo prazer da palavra e na persistência do trabalho. A par disso, tenho criado um público leitor e expetador ao longo dos anos, quiçá, devido ao facto de levar à cena no GITT muitos dos meus textos: poéticos, dramáticos, filosóficos. Agora preparo a adaptação de um romance ao teatro. Sem contar com as dezenas de performances irreverentes que tenho desenvolvido pelo país. Sinto a escrita deste modo a ganhar projeção e outra voz própria, pois, tornar-se: audível, visível, adquirindo outro vulto e entendimento.

3.    CriaPromove: Se possível, faça-nos um pequeno resumo da sua obra mais emblemática (livro e/ou peça de teatro) e destaque um ou dois temas que possam eventualmente gerar mais interesse, polémica e/ou surpresa junto do público leitor/espetador.

Carlos Couto Amaral: Por ser a obra mais recente, destaco Alpinista Descendente enquanto metáfora da vida. Ascendemos com o ideal aceso no coração. O hábito valoriza o esforço da ascensão, embora quaisquer momentos tragam sentido à existência. Mesmo nos instantes em que nos bastidores desmontamos a cena. Para o alpinista existencial na escalada há a possibilidade da “queda”, ou, a inevitabilidade do ato descendente (até ao arrumar das cordas). Será irónico o título? Se a apologia cuida da ascensão, contudo, este alpinista, à luz Sísifo, também é descendente… o que não deixa de rimar com decadente… (mas a rima é branca).
       

4.    CriaPromove: A que tipo de pessoas (eventuais leitores e espetadores) poderá interessar mais a sua obra (escrita e teatral) e porque razão ou razões.

Carlos Couto Amaral: As minhas obras: poéticas, dramáticas, e romances são geradas em sofrimento e prazer, com corpo e alma, daí destinarem-se a todas as idades, desde os meus jovens alunos, aos adultos exigentes, até às pessoas idosas (muito experientes). Recebo de todos uma afetuosa receção. Em simultâneo, os comentários e recensões criticas incentivam-me a continuar a escrever com empenho e paixão.


5.    CriaPromove: Partilhe conosco e com o público leitor a forma mais prática e eficaz de se comprar/adquirir os seus livros.

Carlos Couto Amaral: Os meus livros são adquiridos em feiras do livro, nos contextos das performances que faço, junto das livrarias, ou encomendados na FNAC. Podem ainda contatar as editoras dos meus livros (Edições Colibri e Ed. Minerva). Um dos títulos pode ser também encomendado pela WOOK (Bertrand) em:

       

6.    CriaPromove: Queira destacar e partilhar conosco e com o público leitor o seu melhor projeto literário/criativo até agora. Fale-nos também dos eventuais projetos para o futuro (livros, peças de teatro e/ou outros).

Carlos Couto Amaral: Tenho no prelo um romance, prestes a ser publicado: Falatório do Tempo. Por outro, creio que a última obra editada é a que aquece, de momento, mais o âmago. Alpinista Descendente apresenta a transposição para a poesia de inúmeras experiências de montanhismo e de vida. Confronto-me com a descoberta dos próprios limites e com a transfiguração artística, que primeiro me extasia, e depois acredito, extasiará o leitor.

7.    CriaPromove: Qual a sua opinião e sensibilidade sobre o mercado livreiro em Portugal e na Europa? O que melhoraria e o que alteraria neste complexo mercado?

Carlos Couto Amaral: A promoção efetuada pelo autor é arrojada e envolvente. Mas, as editoras podem sempre fazer muito mais, quer na distribuição, quer na divulgação, quer na abertura a outras estratégias mais empenhadas, indo muito além dos lançamentos das obras. Pela minha parte, por ora, estou também interessado em entrar noutros mercados internacionais. A tradução de algumas das minhas obras será um desafio e um dos passos seguintes…

8.    CriaPromove: Sabemos que infelizmente a Comunicação Social tradicional (Imprensa / Rádio / Televisão) dá pouco destaque aos Escritores e aos homens do Teatro e os poucos que são “falados”, acabam sempre por ser os mesmos. O que pensa disto e o que propõe para que os Media passem a fazer o seu trabalho e a terem  de facto uma atitude de equidade e de justiça?

Carlos Couto Amaral: Creio que, neste contexto, vivemos uma crise de valores, pois, sofremos de uma crítica literária incipiente, por exemplo o JL, a Ler, a Estante (exceção ao último número, até que enfim!) apresentam-nos as mesmas obras requentadas. Ou, as televisões que podiam substituir milhares de horas de emissão de banalidades; em contracorrente, deviam dar a oportunidade aos novos sinais dos tempos, na dimensão cultural – dessa forma os povos crescem coletivamente! E, noutro registo, os orgãos de comunicação mesmo quando dão antena à literatura, lamentavelmente, enveredam no facilitismo de divulgar os ditos vultos glorificados. Falta a aposta no levantamento de novas valias, que por isso, retardam em afirmar-se, ficando dissolvidos no universo astronómico das edições. Portanto, os críticos literários estão em falta, deviam efetuar um trabalho criterioso de descoberta e destaque de outros valores, que renovem a cultura! (“É a cultura que nos diferencia dos cabreiros” Nietzsche).

9.    CriaPromove: Muitas outras questões ficaram por colocar, contudo, foi para nós um prazer e um privilégio termos “conversado” consigo e termos conhecido um pouco melhor o escritor, o poeta, o dramaturgo, o encenador Carlos Couto Amaral e uma parte da sua obra. Agradecemos a sua participação no nosso projeto e pedimos-lhe que deixe uma mensagem/recado e/ou um desejo final.

Carlos Couto Amaral: Escrevo com empenho, amor, e um estilo que vai ganhando cunho. É a minha parte no jogo literário, a outra deverá ser jogada pelos outros intervenientes. O mesmo é dizer: leiam-me, comentem-me, critiquem-me e fruam – tanto quanto eu o faço.



«(…) os críticos literários
estão em falta (…)»

10. CriaPromove: Escolha por favor um pequeno excerto (não mais do que 10 linhas ou versos) e/ou poema de um dos seus livros ou peças de teatro (publicados ou a publicar) para “aguçar o apetite” dos potenciais leitores. Desejamos todo o sucesso e sorte do mundo pois a sua obra bem o merece! Aceite um abraço da equipa CriaPromove.

Carlos Couto Amaral:

Da obra mais recente,
«ALPINISTA DESCENDENTE», Edições Colibri

         METAMORFOSE DO ESPÍRITO

Borboleta voa no mundo inteligível
o bater de asas em Atenas
causa a tempestade no poema de Lao-Tsé
A metamorfose da lagarta
rasteja até voar
asas atiradas à brisa
corpo à terra
fogo ao coração
Lava a mente
na água-furtada
borboleta em busca
da luz lunar
nas esferas de cristal
asas de Ícaro
na noite de Van Gogh
O bater das pestanas
cria tempestade nas emoções
sabor da novidade
perfume de primavera
a despertar borboletas
(em substituição da andorinha
que sozinha não faz o provérbio)
Tomo-te nos braços elevo-te
ao jardim a cheirar a esperança


CriaPromove
De Portugal para o mundo!

 www.criapromove.com





quarta-feira, 27 de abril de 2016

sábado, 23 de abril de 2016

quinta-feira, 21 de abril de 2016

Contracapa de Alpinista


Carlos Alfredo Couto Amaral nasceu em Mangualde em 1960. Licenciado em Filosofia. Professor na Escola Daniel Sampaio (Sobreda de Caparica). Mestre na Simbologia e
Estética de Nietzsche. Encenador e dramaturgo, escreveu (G)Estação dos Afetos; Meu Fado quase uma estória pirosa de amor, 2013 (Edição em parceria com José Teixeira e Xico Braga), levadas à cena pelo GITT. Publicou poesia: A Sombra dos Momentos Felizes (Edições Colibri, 2000); Sereno Fluir das Horas (Edições Colibri, 2004); Desflorar da Flor de Sal (Minerva Editora 2010). Nos encontros de professores galegos e portugueses da paz orientou oficina de escrita criativa (2013 a 2015).

Alpinista Descendente é a metáfora da vida. Ascendemos com o ideal aceso no coração. O hábito valoriza o esforço da ascensão, embora quaisquer momentos tragam sentido à existência. Mesmo nos instantes em que nos bastidores desmontamos a cena. Para o alpinista existencial na escalada há a possibilidade da “queda”, ou, a inevitabilidade do ato descendente (até ao arrumar das cordas). Será irónico o título? Se a apologia cuida da ascensão, contudo, este alpinista, à luz Sísifo, também é descendente… o que não deixa de rimar com decadente… (mas a rima é branca).




quarta-feira, 20 de abril de 2016

POSFÁCIO de ALPINISTA DESCENDENTE


 


No silêncio dos dias intensificam-se impulsos, dedilhando as cordas da poesia, entre a ebulição dos sentimentos e as emoções meridionais, num tempo por definir, onde se pincela o lado bom das palavras, formando um tapete para o “Alpinista descendente” onde o poeta toma em si uma multiplicidade de sensações.

Neste tomo de poesia, Carlos Amaral tenta comunicar, fazer passar as suas ideias, aquilo que vai no seu âmago e “as palavras sabem a música”! Quantas letras no fundo de si, em delírio? A força de ser abre diversas portas para o mundo e a necessidade de encontrar a realidade desnudada é outra questão intensa, patente na obra em causa. Procura a normalidade ante a agitação do quotidiano e os seus versos primem essa situação onde o ar parece rarefeito.

A natureza tem uma função apaziguadora, entre o vento, a água, as libelinhas e os nenúfares… o lírio azul, a borboleta e a neve… elementos na caça ao colorido. Imagens fulcrais estas, para nos levar de uma forma mais sublime ao mundo da realidade, no namoro dos arquétipos da natureza.

Pautam-se ritmos, o dedilhar da pele, a passagem dos dedos, o “rio que refresca os pés” e “o horizonte alivia a mente” do poeta. Qual perfeita orquestra pronta para fazer tocar-nos a alma! Todo um corpo mental e físico de sensações “abrindo a imaginação”, elevando um cálice de vinho, bebendo os poemas um a um e nunca serão os mesmos. A poética aqui presente pauta-se por odores coloridos, tentações e inquietações onde os relógios celebram o seu tempo em espiral, segundo a segundo no corpo que oscila no silêncio dos prazeres ao mausoléu do silêncio. Entre tantas sensações qual a sensação de se estar na relação com o mundo?

Neste seu livro “Alpinista Descendente”, avança por um percurso graduado, tomado de energias e impulsos que se vão renovando, na encosta da dúvida, para “encontrar medida à luz da escala reduzida”. Ritmos que o abatimento cardíaco rouba ao silêncio, na ascensão da vida a um arremesso de réstia fria na montanha da existência.

A descrição e imagens que Carlos Amaral usa nos seus trabalhos poéticos são de uma riqueza maior, fogem ao vulgar, imprimindo um manancial de figuras estilísticas, acaso se faça uma leitura atenta da sua obra. O ritual poético concebe um ouvido atento que desperta a atenção do leitor, deixando uma janela aberta no relicário vático.

Metamorfoses de sentido entre as portas invisíveis da poesia e o tempo que possibilita a mudança, por diferentes timbres e aromas de sentido. A inquietação da alma escreve nos laivos do arco-íris, uma panóplia de cores que traduzem a diversidade de sentimentos e emoções, um “isto”, que colhe o “pólen nos apetites da luz”, lugar secreto da interpretação que o amor oculta, discretamente.

Esta poesia ilumina a mente dos leitores, traça realidades ímpares, por vezes “espelhos paralelos”, infundindo o mistério da imagem e dos mitos que são um motivo de reflexão de um aqui cimeiro. O poeta nesta obra apresenta o seu estilo próprio e o traço do “Alpinista Descendente” que transpira de sentidos metafísicos ao tanger da metáfora do ser.

Da leitura sobranceira assiste-se a realidades e prolongamentos da aurora boreal, na decantação das sensações a uma suposta metamorfose do espírito, pautando tempestades platónicas ao crivo de Lao-Tsé, por novas esferas de conceber o mundo; tempestades de sentir e divagações poéticas entre o juízo do gosto que por vezes permite trocar as regras do jogo na relação com os outros. Carlos Amaral no “Alpinista Descendente” realça a importância dos elementos da natureza, entre a palavra e o silêncio, o sol e a lua, ao simples beijo e a melancolia da idade à delicadeza do colibri e o seu triunfo de sorver o mel das flores emplumadas, harmonia e realidades complementares. Neste seu trabalho assiste-se a uma força original, a um fluxo que gera uma nova força, por um princípio filosófico que absorve e nos deixa lançados a novas respostas num lago de desejos e ritmo, poesia de uma nova postura, fugindo às métricas e rimas tradicionais e cheias de monotonia... Grandezas e posturas no seu poema: “Perícia do voo”, onde se “abrem portões ao fundo das sombras”, é este voo, o convite que o Carlos Amaral nos faz, na tentativa de desprendimento dos relógios do tempo, do acaso entre os casos, das resistências, possam ser políticas ou não, bem como aos impulsos que nos assaltam quando menos esperamos. A mente é a central do mundo de cada qual, absorve o que a envolve e a mesma devolve o que não interessa e “devia entregar-me à alegria / que a tristeza é manca / cega de um olho / em luto de algo a perder”… e navega-se entre afetos e fantasia, vezes sem conta confundindo o caminho traçado um dia, carecendo o nome para o completar…

E para onde vamos? E se vamos, porque vamos? Onde é o fim do mundo? Num dos seus poemas magistrais “Intuição poética”, atenta-se à sensibilidade, ao significado, ao verbo com o intuito de comunicar, mitigando o tédio, com a esperança de imprimir a sequência dos aromas… e o Carlos Amaral é “profeta, adivinho da sensibilidade…” e o “poeta é um fragmento das estrelas”… “pedaço de palavra emocionada”! E o que resta do plenário poético? “Intuições” que “amassam o grito à solidão”, sendo esta a volúpia e a companhia, no exílio do encarceramento poético; afinal o que é que está no poeta e o que é que se separou de si?

Sonhos e delicadas especulações… são os trilhos do amor, o deserto e o banquete das sensações e tudo isso confere forma à alma do poeta, apesar das inquietações existenciais a que nos lança, deixando-nos “na ilha do tempo…” onde “o sentimento dá sentido / galga a aridez do deserto / Cala o silêncio no peito…” e “desperta a aurora das emoções” uma nova vertente de conceber o que está em torno daquele que sente.

A poesia de Carlos Amaral conduz-nos a um arrebatamento, pelo puro sentido da sua forma, quando o leitor ou ouvinte se deixa tomar por ela; no traço audacioso da sua escrita, solta um toque especial por cada verso; como a conjugação das notas numa composição, executadas na lira das palavras que bebem da interioridade; o belo enceta na sua poesia uma relação, entrega efusiva de sentimentos e emoções, independentemente da sua natureza, assim, o poeta absorve do princípio do prazer, face à simetria do sentido, um mundo cheio de cadências e pontos de execução que vão dando sentido à sua vida.

Palavras do diário da alma na sinfonia da viagem existencial… escrever é existir! O poeta deixa-nos conceitos do sentir e da imaginação concebendo a sua epopeia filosófica, na destilação do verso, pelo marulhar da metamorfose das formas poéticas, nas ruas do sonho, ao ritmo das situações a que se expõe, guarnecendo a malha de um novo mundo. O trabalho presente é um convite à reflexão filosófica, de caris ontos existencialista e assim se navega nas palavras entre as sensações e a consciência de situação. O momento por cada vez é sempre único, procura-se a essência daquilo que é, no esplendor metafísico das Ideias, à moda platónica! Neste livro assiste-se a uma viagem poética com imensas estações entre o sensível e o inteligível, no diverso das rédeas da estética literária e filosófica. O convite fica feito…

Carlos Amaral está de parabéns por este seu exemplar trabalho “Alpinista Descendente”, fica o convite para a leitura da obra, onde deve ser feita devagar e saboreando o teor dos conceitos e tónus poético.



Tavira, 02 de Janeiro de 2016

Jorge Ferro Rosa

segunda-feira, 18 de abril de 2016

Na vertigem do Alpinista


Os músculos tensos
vencem as alturas
o espírito encontra
a dádiva no ar rarefeito
O Alpinista Descendente de Carlos Couto Amaral, trazido a público pelas Edições Colibri, trata estados emocionais experienciados entre píncaros e vales: na Estrela ascende com quatro estações num dia; nos Picos da Europa escala entrincheirado entre ravinas; alcançando nos Alpes a vertigem e a beleza que sacodem o aventureiro. Na viagem pelas montanhas busca a plenitude, as sensações naturais, a serenidade. O Alpinista abandona o frenesim urbano e alcança o que ambiciona: neblinas, córregos de água, plantas exóticas, sons bucólicos, ares rarefeitos, tranquilidade… Renova a ousadia e a entrega nas arriscadas sendas, que aliviam a alma do peso e da saturação. Enfim os sonhos concretizados reforçam a vontade. E, as narrativas poéticas lapidam sensações brutas.
O poeta
é um fragmento das estrelas
é a gota do mar
é palavra emocionada
O Alpinista Descendente faz a apologia de Sísifo feliz, nos atos que trazem ao homem certa grandeza, mesmo que vã, consciente dos esforços na ausência de transcendência. O mesmo é dizer que superamos o absurdo através do esforço e da luta.
Em queda
Sísifo encontra motivos
no intervalo proibido
O Alpinista Descendente, com o despojamento, na ascensão liberta-se do peso; já ao descer integra o pensamento, aligeirando o mundo das fragas vencidas.
Desce
à planície
alegria
sem peso
O poeta concretiza a viagem simbólica… O Alpinista Descendente quer ar puro, a renovação, ampliando horizontes que dilatem a alma:
irei ao começo dos tempos em demanda do segredo
irei ao cume da montanha em demanda da aurora
A cinestesia identifica a dinâmica da aventura na demanda que cruza desejos, ideais, sensações, imagens. No quarto livro poético, Carlos Couto Amaral apostou na depuração estética, na quase ausência de pontuação, e na verticalidade da escrita sob a analogia do percurso escarpado.
Sonha
Ícaro
a furtar
a cera
às abelhas
e a altura
em metamorfose
escuta
atrás
das portas
invisíveis
O alvoroço da escalada liberta adrenalina. Na disputa com o gigante o prazer é proporcional ao esforço. Há um deslize de palavras colhidas na inspiração do acaso. A serra sem um caderno pode tornar-se esmagadora, mas a vontade da montanha exprime-se por meio do poeta, superando opressões e receios.

Performance de "Alpinista Descendente"


domingo, 10 de abril de 2016

Abraço da serpente


O filme do cineasta colombiano Nilbio Torres, Abraço da serpente, aborda a aventura de um alemão Theo na busca de uma planta curandeira misteriosa: a yakruna, uma droga com o poder simbólico e terapêutico de fazer sonhar. O explorador europeu gravemente doente procura a ajuda do xamã Karamakate um dos últimos índios da tribo Cohiuanos, para lhe servir de guia no percurso do rio Amazonas.

Mostra-nos como os índios nos sonhos encontram soluções para as doenças do espírito. É uma psicanalise à medida dos símbolos indígenas. Noutra história posterior o americano Evans, lendo os diários de Theo procura ter mais êxito, na mesma demanda, por essas paragens entretanto transformadas.

O filme realça o encontro de civilizações no confronto do eu com o outro; a par, dos receios, incomunicações, aproximações e afastamentos e do processo do esquecimento para assumir nova identidade ("endoculturação").

Os índios acusam os brancos de trazem: o domínio pela força, a guerra e a morte. É o caso dos seringueiros que desapossam a dignidade, a identidade, escravizam, mutilam… Expropriam as matérias-primas da floresta e o território. Rompem os equilíbrios, provocando hecatombes sociais, cataclismos ecológicos e culturais. O abraço da serpente representa a alegoria simbólica de uma cultura a estrangular e aniquilar outra.

No encontro do “eu” e do “outro” surgem crises de aprendizagem entre civilizações diferentes. O índio auto despojado de bens quer manter-se em sintonia com a floresta – preservar a cultura ecológica. Por seu lado, Theo traz a bussola para se orientar – mas prefere perder a amizade dos indígenas, do que ser desapossado desse utensilio. Justifica que aqueles perderiam o modo natural de se orientarem, abandonando um património cultural integrado na floresta.

O filme pela capacidade de nos fazer pensar, atualiza a reflexão simbólica que se encontra nas nossas mentes em estado de saturação. Propõe o despojamento libertador, uma viagem de purga e catarse. É um filme obrigatório para detetarmos as raízes primitivas que ainda estruturam a nossa mente profunda. Defende a preservação da diversidade das culturas humanas, que ainda restam, por nos poderem ensinar muito acerca de quem somos. Afinal, o que é o homem?

sábado, 9 de abril de 2016

Métafísica estética do jovem Nietzsche

NATUREZA E FUNÇÃO DO SÍMBOLO NA METAFÍSICA ESTÉTICA DO JOVEM NIETZSCHE por Carlos Alfredo do Couto Amaral Dissertação de Mestrado em Filosofia, Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa, Lisboa, 2000, 205 páginas.

1. Nesta dissertação analisámos o conceito de símbolo tal como o jovem Nietzsche o tratou entre os anos de 1871 a 1873, correspondendo à época de O Nascimento da Tragédia. Em termos gerais, Nietzsche abordou a problemática da função simbólica a partir do mito e da arte como domínios integrantes duma tarefa hermenêutica. A este propósito enunciamos o seu enraizamento num período da filosofia que foi dos mais marcados pela simbólica, referimo-nos concretamente ao romantismo alemão.

Desde o início que destacamos na conceção de Nietzsche a transposição como a categoria fundamental do símbolo, a qual indica o transporte e a mudança de uma imagem e de um significado para outro contexto. O símbolo é assim apresentado como um elemento essencial da comunicação que relaciona as diferentes dimensões em jogo na estética. Para este filósofo, o símbolo e a metáfora equivalem-se parcialmente enquanto processos artísticos que estabelecem relações inventivas. De forma implícita Nietzsche mostra-nos que, apesar de existirem traços comuns entre o símbolo e a metáfora, tal não é suficiente para os confundir e identificar, pois o símbolo radica na profundidade do inconsciente musical, enquanto a metáfora se processa à medida da dimensão da linguagem poética, a qual em último caso tem uma matriz literária. Neste sentido, o símbolo pretende estar próximo dos fluxos da vida.

Não reduzimos o símbolo à metáfora, pois a música tem um papel essencial na metafísica estética de Nietzsche sem se subordinar à imagem. A relação da imagem com o símbolo corresponde à intuição que leva o sujeito a conceber a presença do objeto. A força da fantasia vem desempenhar aqui a função de um pensamento que se desenvolve através de associações livres das imagens. Nesta sequência, Nietzsche trata a imaginação como a faculdade simbólica por excelência, que estabelece a unidade entre as diferentes imagens através de conjeturas audaciosas. Na verdade, o sujeito ao fantasiar estabelece comparações que transpõem os significados para domínios desconhecidos, como acontece com a máscara, a qual revela e esconde a força da vontade, transfigurando completamente a realidade em causa.

Entretanto, pensa Nietzsche que o corpo concentra e transfigura através da simbólica da dança e do bailado as características fundamentais da essência da natureza no que se refere à força e à energia. A força e a potência aqui retratadas permitem compreender a própria transposição e transfiguração simbólica da arte. O nosso filósofo pensa que a partir da relação dialéctica entre a força e o significado (inerentes ao símbolo) podemos compreender as forças da natureza e o modo como estas transitam para a arte.

2. Ao investigar a origem do símbolo na força matricial que o sustenta, Nietzsche detecta que existe um fundo inconsciente orgânico e 'sapiencial' que é necessário tornar consciente. Apesar disso, não existe para ele uma ponte segura para a transposição deste elemento para aquele, pois o nível inconsciente não se deixa submeter aos princípios formais da lógica que são a panaceia onde se esconde a fragilidade do racionalismo abstracto.

Em contrapartida, considera Nietzsche que os impulsos cegos do organismo são transpostos de modo simbólico, primeiramente para as vivências sentimentais e depois para as actividades culturais; ou seja, o inconsciente é a fonte energética do processo simbólico. Identifica ele nessa potência subterrânea uma torrente que atravessando os sentimentos se constituem como referenciais semânticos com a capacidade de produzirem novos símbolos.

Na perspectiva do nosso filósofo todo este processo é indirectamente controlado pela vontade; e, como se sabe, a categoria da vontade no jovem Nietzsche depende da filosofia de Schopenhauer. Com efeito, ambos os filósofos concebem o ser e o mundo como entidades dinâmicas, pensando que o mundo é uma representação e manifestação da vontade. Implicitamente o génio aparece aqui como a entidade "subjetiva" que sente a força da vontade a pensar com ele acerca da produção das novas formas; o que significa que o génio é o culminar dessa orgânica da vontade, procurando dominar a 'Força da Vida' para a partir desse fundo inconsciente poder criar as formas simbólicas, as formas míticas, as formas poéticas.

3. No desenvolvimento de tal aspecto, o mito e a arte desempenham em Nietzsche uma função simbólica acrescida na medida em que os utiliza, altera e recria como narrativas e ilustrações do seu próprio modo de pensar. Logo ao entender o que é essencial no pensamento deste filósofo, convertemo-nos em intérpretes dos seus mitos e dos respectivos símbolos artísticos. No entanto, se já vimos como nascem os símbolos, agora convém observar como é que eles desaparecem.

No prosseguimento dos românticos, o jovem Nietzsche critica a ausência das crenças míticas no que se refere à modernidade, revelando a decadência que é provocada pela racionalidade, a qual tudo quer explicar e desvendar, banindo o espaço da incerteza, da dúvida e do espanto. O mesmo é dizer que o "Iluminismo" ['Aufklärung'], ao projetar uma compreensão das crenças, dos sentimentos e dos símbolos acaba por os destruir. Na perspectiva de Nietzsche, o desaparecimento dos símbolos míticos leva à uniformização mental e à falência da civilização moderna que "perdeu a pátria mítica" por se ter desenraizado culturalmente das forças criadoras da vida. Ao diagnosticar este ambiente de decadência, Nietzsche considera, no entanto, a possibilidade duma regeneração por meio do retorno nostálgico ao mítico, a partir de um diálogo vivo entre a música e a filosofia. Tudo isto porque a música é a área cultural em que os símbolos ainda vivem, constituindo-se assim como o centro regenerador da criação e do pensamento. Aqui recorre-se à inspiração de Wagner, na medida em que este ousou pensar por meio de acontecimentos visíveis e sensíveis através de um envolvimento mítico. Considera Nietzsche que em Tristão e Isolda e na trilogia do Anel dos Nibelungos encontramos um género de narrativa dramática que desenvolve as ideias metafísicas sob a forma simbólica. A música constitui desta forma a nova inteligibilidade do pensamento sem negar a sensibilidade, permitindo refletir sobre a arte a partir dela mesma. Pensa Nietzsche que a música de Wagner é um mote para a reflexão, possibilitando uma compreensão metafísica mais elevada do que qualquer filosofia já conseguiu. Como corolário, Nietzsche considera que a música é o espírito que origina a tragédia, participando na génese do coro (que é o elemento da união mítica entre a música e a palavra). Deste modo, o mito é o elemento comum que permite estabelecer a mediação entre a tragédia grega e o drama musical wagneriano.

Posto isto, pretende Nietzsche uma fundamentação mais recuada, procurando na Grécia Arcaica as condições ideais da formação dos mitos da tragédia; é neste sentido que analisámos um dos mitos, entre outros, a que ele mais recorre. Trata-se com efeito da história de Édipo, que é o símbolo dionisíaco do homem trágico, encontrando-se em luta e sofrimento face à interpretação do seu destino. Essa figura mítica é concebida por Nietzsche de modo ambivalente, considerando que Édipo é uma máscara do sofrimento dionisíaco, mas também é o "símbolo da ciência", por interpretar os mistérios mais profundos da natureza humana. Notámos que Édipo escuta vaticínios horríveis acerca de si próprio; no entanto, à medida que se vai descobrindo, o seu próprio destino irracional é realizado. Este herói interpretou o enigma da Esfinge e, ao revelar-lhe o segredo desmistificou-a, matando-a com as armas da razão. No fundo, Édipo representa a união do pensamento mítico com a emergência de uma reflexão simbólica e filosófica, por se apresentar como o decifrador dos enigmas; todavia, apenas aquele que está na posse da 'ciência' da interpretação dos símbolos pode decifrar o enigma com verdade. Neste caso a 'adivinha' é apresentada pela Esfinge, que é a figura por excelência da razão enigmática.

4. Em analogia com esta conceção, Nietzsche apresenta Apolo como o símbolo da ilusão, do sonho e também da adivinhação. Torna-se deste modo evidente que Apolo se identifica com Édipo, por este herói e aquele deus partilharem uma faculdade oculta. Já na mitologia grega Apolo era apresentado como o deus do oráculo que possuía os poderes da adivinhação do futuro. Com efeito, ele representava uma modalidade da razão que tinha por finalidade decifrar os mistérios. Em contraposição a Apolo, considerámos que Nietzsche aborda a figura de Dionisos como o símbolo dilecto do seu próprio modo de pensar. Através desta divindade o filósofo trágico representa o êxtase da embriaguez, o excesso, a criatividade, a paixão sexual e as forças naturais da vontade.

Pretende Nietzsche compreender as forças que estão na origem dos símbolos e das obras de arte, apresentando o dionisíaco e o apolíneo como paradigma da relação dialéctica de luta e de união dos opostos. As noções de conflito e harmonia dos opostos procuram dar respostas às confrontações entre as entidades polarizadas, tanto no plano natural, como no plano simbólico e metafísico. Deste modo, o conflito retrata a dissonância e o sofrimento tal como é abordado na obra trágica. Teve Nietzsche a intuição de que na arte existe a comunicabilidade entre os diferentes níveis da realidade, descrevendo-os através da transposição da linguagem não figurativa (dionisíaca) para a linguagem figurativa (apolínea). Esses elementos diversos ora se unem, ora entram em litígio estimulando a produção das novas obras. De facto, o acto criador espelha e perpetua o conflito - Dionisos avança com a força desmedida que Apolo equilibra através do saber configurado!-. A tragédia ática é precisamente o resultado da conciliação entre essas forças antagónicas. Verifica Nietzsche que existe na tragédia uma forma de criatividade que leva à harmonização das duas figuras simbólicas, de tal modo que as relações complexas dos princípios apolíneo e dionisíaco podem ser traduzidas numa aliança de recíprocas conversões linguísticas, que identificam a comunicação ontológica e estética.

Enfim, este processo 'dialéctico' representa a transposição criativa no qual a informe vontade dionisíaca se manifesta na linguagem da forma teórica apolínea, tornando fecundo assim o casamento entre estes princípios opostos. Nietzsche sublinha, contudo, que a conciliação instintiva dos contrários se gera nos abismos da razão inconsciente, revelando uma cisão ontológica, que no plano biológico é traduzido pela luta e atração entre os sexos. Em suma, o nosso filósofo critica a racionalidade fundada na lógica abstracta, mas, em contrapartida, defende uma racionalidade que comporta as forças da vontade na sua transformação e contradição. Trata-se de uma razão viva que é percorrida e animada pelos símbolos criadores da natureza, do mito e da arte. O que significa que o problema do símbolo traduz as diferentes formas da razão orgânica se apresentar e comunicar, pois através do processo transpositivo ela estabelece a unidade no seio da metafísica estética. Enfim, pretendeu Nietzsche desenvolver um pensamento que estivesse ao serviço da renovação civilizacional, considerando que os símbolos morrem se não desenvolvem a capacidade da constante criação dos seus significados. Daí o filósofo da tragédia ter sido o arauto da renovação que ainda está em curso, criticando na modernidade a desvitalização e a morte dos significados simbólicos.